terça-feira, 15 de julho de 2014


NEM DINHEIRO ESTÁ COMPRANDO TUDO

Diz a cultura popular que quando dinheiro e pisa não resolverem uma pendenga é porque foram pouco. De fato, a tal da pisa (surra, sova) já reinou de forma quase infalível ao tempo em que as intimidações físicas eram solução de muitos casos intrincados onde uma parte tinha dificuldade de ceder à outra. Mas, na medida em que a pisa foi caindo em desuso, por causa do avanço do aparato policial e judicial contra a violência, o dinheiro ficou soberano sozinho.

A pisa tinha a capacidade de convencer pessoas fracas e hesitantes, intimidar pessoas atrevidas e dominar pessoas valentes. Na prática, era um instrumento da desmoralização do homem. Na política, dizem os mais velhos, era um santo remédio para afugentar as traições, para silenciar os mais falantes e até para persuadir (entre aspas), verbo que não tinha o sentido moderno que lhe emprestam hoje de “levar a crer ou a aceitar, ou levar a se decidir a respeito de algo”.

O dinheiro leva grandes vantagens em relação a pisa porque, embora no mesmo campo de aplicação tenha também sentido desmoralizante, além de não se revelar pela agressividade física, cria uma sensação de negocio, de troca, de satisfação entre quem compra e quem vende. É, digamos, um negocio prazeroso entre as partes, que não deixa marcas visíveis aos outros, a não ser quando a operação sai do domínio dos interessados e cai no olho da opinião pública.

O único problema do uso do dinheiro na compra e venda de caráter político é que ele não adquire bens materiais ou coisas e sim pessoas. Mas, afinal, o ser humano não é um bem material não? É, sim, mas o homem que o dinheiro compra não é um bem corpóreo, físico, é o ser imaterial, pensante, revelado e exposto através do atributo da personalidade. Os antigos já chamavam isso de “negociar ou vender a própria alma”, aquela operação em que o homem vendia tudo, sobrevivia mas não lhe sobrava nada.

Até as últimas horas do final de junho, realizarem-se inúmeras operações de compra e venda de almas políticas no Estado da Paraíba, embora as mais caras não tenham se realizado. Mercadores do reino correram aflitos os quatro recantos de João Pessoa e Campina Grande, com as burras carregadas de ouro, a fim de testar a cobiça e a lei da oferta e da procura, esta até então nunca vista antes no Estado com tal sofreguidão. Lembram-se quando se compravam os votos dos pobres da periferia na noite anterior ao dia da eleição algum tempo atrás? Foi a mesma coisa, só que com líderes, e não com eleitores comuns. Que sodomia endiabrada é essa?

Já se sabe agora certos detalhes das negociações. Um deputado estadual valia um pouco mais de 1 milhão. Um partido grande valia quase 20 milhões, incluindo seus deputados. E um partido médio, desses que tem dono e força familiar, foi cotado por 6 milhões, embora pedidos 10 milhões. Houve até quem apalavrou o negocio, recebeu uma parte e, como a parte era menor do que o combinado, ‘amoitou’ (escondeu por trás da moita) e escapuliu. Os antepassados da zona rural diziam assim: “mordeu o peão e fez finca”, querendo dizer que o cabra provou do sabor e correu.

Mas, por que a maior parte desses negócios não foi realizada? Primeiro porque entre o pedido e a oferta a distância era grande. Depois porque os vendilhões tinham medo de um escândalo ou de enfrentar a censura da opinião pública. Por fim, porque todos queriam um grande adiantamento e o comprador estava ressabiado diante de calotes já ocorridos e não confiava em seus interlocutores, nem vice-versa.

Foi também surpreendente o papel de alguns intermediários do reino, que propuseram acrescentar às somas, ao final de cada operação por grupo, 1 milhão de reais, às escondidas, para pagamento da corretagem dele – um segredo que não podia chegar ao palácio real. Mas, foi a primeira vez na Paraíba em que dinheiro muito resolveu apenas um pouco. O palácio tem ouro que nem os súditos querem.

Este artigo integrará o futuro livro:
‘PREVISÕES POLÍTICAS DE UM VIDENTE CEGO’
E-mail: gilvanfreireadv@hotmail.com

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